Com uma igreja dividida, conclave mais internacional da história reúne cardeais de 70 países 5b3638
A palavra conclave vem do latim (cum clavis) e quer dizer fechado à chave. Este é o nome da reunião ultrassecreta dos cardeais da Igreja Católica, que começa na quarta-feira (7), com o objetivo de eleger o novo papa. O evento solene e misterioso reunirá 133 cardeais de todo o mundo, com menos de 80 anos, que podem votar na seleta escolha. Eles ficarão reclusos na Capela Sistina, no Vaticano, até que um nome alcance a maioria de dois terços. Quando isso acontecer, a fumaça branca será liberada pela chaminé e o mundo inteiro saberá que foi escolhido o sucessor de Francisco, morto em 21 de abril, aos 88 anos. 1i2f51
A palavra conclave vem do latim (cum clavis) e quer dizer fechado à chave. Este é o nome da reunião ultrassecreta dos cardeais da Igreja Católica, que começa na quarta-feira (7), com o objetivo de eleger o novo papa. O evento solene e misterioso reunirá 133 cardeais de todo o mundo, com menos de 80 anos, que podem votar na seleta escolha. Eles ficarão reclusos na Capela Sistina, no Vaticano, até que um nome alcance a maioria de dois terços. Quando isso acontecer, a fumaça branca será liberada pela chaminé e o mundo inteiro saberá que foi escolhido o sucessor de Francisco, morto em 21 de abril, aos 88 anos. 2b6u2x
Maria Paula Carvalho, da RFI
Um sinal concreto da iminência do conclave, na manhã desta segunda-feira (5), técnicos trabalhavam com a ajuda de um guindaste na instalação de cortinas vermelhas na sacada da Basílica de São Pedro, onde o papa eleito fará a sua primeira aparição pública.
A Capela Sistina, famosa pelos afrescos do pintor renascentista Michelangelo, entre eles "O Juízo Final", está fechada para os turistas e foi adaptada para acomodar a cerimônia, datada da Idade Média. Pelas regras do Vaticano, no dia do conclave, os cardeais participarão de uma missa solene na Basílica de São Pedro, antes de se reunirem à tarde para a votação a portas fechadas, que pode durar vários dias.
Coberto por cerca de 5.000 jornalistas, este conclave gera um interesse sem precedentes no mundo inteiro, muito além das esferas religiosas, como evidenciado pelos milhões de euros em apostas sobre a identidade do próximo papa, assim como o interesse pelo filme americano-britânico de mesmo nome, estrelado pelo ator Ralph Fiennes e lançado em 2024.
A eleição sigilosa prevê quatro votações por dia, duas pela manhã e duas à tarde. O resultado do conclave é imprevisível e a Igreja se divide, atualmente, entre os que defendem a continuidade das reformas iniciadas pelo papa Francisco ou uma guinada mais conservadora.
Alguns nomes se destacam como fortes candidatos até o momento:
Entre os cardeais apresentados como favoritos ou "papabili", está o filipino Luis Antonio Tagle, arcebispo emérito de Manila. De origem asiática, da linha progressista, ele trabalha na Cúria Romana, órgão istrativo do Vaticano. Apelidado de "o Francisco asiático" por conta de sua relação com os pobres e marginalizados, o cardeal tem posições firmes contra a pedofilia na Igreja.
O italiano Pietro Parolin, que desde 2013 atua como secretário de Estado do Vaticano e número 2 da Igreja, está entre os mais cotados. Ele tem um perfil moderado e conciliador, como tem demonstrado no cargo atual e que basicamente reúne as funções de um primeiro-ministro e um ministro das Relações Exteriores.
Outro italiano, Matteo Zuppi é da ala progressista. Em 1992, Zuppi foi um dos mediadores que alcançaram um acordo de paz para encerrar mais de 16 anos de uma guerra civil sangrenta em Moçambique. Com grande experiência diplomática por sua atuação na "Comunidade de Santo Egídio" - organização católica apelidada de "a pequena ONU de Trastevere", em referência ao bairro romano onde fica a sua sede, o cardeal foi escolhido como o enviado de paz do papa para lidar com a guerra na Ucrânia
Na ala conservadora, uma das apostas é o cardeal Robert Sarah, da Guiné. Seria a vez de um primeiro papa africano? Sarah é um forte crítico das reformas. Ele defende, por exemplo, a celebração da missa em latim. Em 2020, o cardeal se envolveu em polêmica ao combater, através de um texto, a possibilidade de ordenação de diáconos casados como padres na Amazônia, região carente de figuras religiosas.
Da França, são cotados François-Xavier Bustillo, arcebispo de Ajaccio; Christophe Pierre, nomeado núncio apostólico pelo papa Francisco; Dominique Mamberti, (decano da ordem dos cardeais-diáconos, responsável por pronunciar o famoso "habemus papam"); Philippe Barbarin, ex-arcebispo de Lyon, mais antigo cardeal francês; e Jean-Marc Aveline, arcebispo de Marselha que, como fazia Francisco, denuncia o tratamento dado aos imigrantes.
Nenhum nome está descartado 47124b
Do Brasil, Dom Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo; Dom Orani Tempesta, arcebispo do Rio de Janeiro e que participa do conclave pela primeira vez, ou ainda Dom Sérgio da Rocha, arcebispo de Salvador e membro do "Conselho de Cardeais" do Vaticano são cotados para o cargo.
Mesmo que muitos analistas acreditem que este possa ser um conclave rápido, não há certezas. A eleição é aberta a todos e acontece em um momento em que a Igreja tem de lidar com desafios da atualidade, como o papel das mulheres, a prestação de contas, a criação de órgãos consultivos, a bênção aos homossexuais e a proteção de imigrantes.
Nos últimos dias, os cardeais estiveram reunidos para debater temas importantes para a instituição, em que também tiveram a chance de delinear o perfil ideal do próximo papa. Esta manhã, eles descreveram o futuro pontífice como "uma figura que deve estar presente, próxima, capaz de servir de ponte e de guia" para "uma humanidade desorientada".
Perguntado se o próximo papa poderá seguir a linha reformista marcada por Francisco, o arcebispo de Singapura, William Seng Chye Goh pondera: "Reconhecemos o que ele fez, mas nenhum papa é perfeito, ninguém pode fazer tudo", disse. "Encontraremos o sucessor de São Pedro" para estar à frente de uma igreja com cerca de 1,4 bilhão de católicos em todo o mundo, acrescentou à AFP, o cardeal, considerado um conservador.
O arcebispo de Argel, Jean Paul Vesco, considerado progressista, disse "esperar profundamente" por um futuro papa que dê continuidade ao legado de Francisco. "Precisamos descobrir aquele que o Senhor já escolheu", afirmou. "Precisaríamos de muito mais tempo de oração juntos, mas tenho certeza de que, no momento certo, estaremos prontos e daremos à Igreja o papa que o Senhor quer", enfatizou.
A maior parte dos cardeais que participação do conclave na Capela Sistina vem da Europa, continente com 53 representantes, à frente da Ásia, com 23. Com um recorde de 70 países de cinco continentes representados, este conclave já está se configurando como o mais internacional da história, mas também um dos mais abertos, de acordo com especialistas e comentaristas.
Primeiro papa da África 6e3i1f
A África representa 20% dos católicos do mundo. Porém, com 17 cardeais eleitores, o continente tem apenas 12% dos votos no próximo conclave. A pergunta se pela primeira vez na história, veremos um papa africano tem circulado pelo mundo.
Jean-Paul Sagadou é padre em Burkina Faso e jornalista do grupo de imprensa católica Bayard Afrique, em Abidjan e Ouagadougou. Questionado sobre o possível retorno da ala conservadora da Igreja ao poder, depois de 12 anos do pontificado reformista do papa Francisco, ele ressaltou que o argentino iniciou um caminho das reformas. "Eu gostaria que continuássemos nesse sentido", disse, em entrevista à RFI. "Francisco ouviu a base, semeou os grãos de uma reforma profunda da Igreja, e espero que possamos continuar essa missão", disse.
Em dezembro 2023 quando o papa Francisco autorizou a benção de casais homossexuais, surgiram vozes dissonantes dentro da Igreja, especialmente entre os cardeais africanos, que enviaram uma mensagem de protesto à Roma.
"Talvez tenha havido uma incompreensão de alguns, mas é preciso levar em consideração que a trajetória histórica dos povos não é a mesma, as referências culturais são diferentes", analisa Jean-Paul Sagadou. "Porém, acredito que é possível viver em comunhão, mesmo com as nossas diferenças. Acredito ser possível pensar globalmente e agir localmente. Acho que a África pode se alinhar ao resto do mundo, mesmo nessa questão sensível da moral", completa.
Para Jean-Paul Sagadou, a preocupação não deveria ser geográfica ou temporal. "Não penso que seja uma questão de tempo. É claro que os africanos ficariam contentes de ter um papa africano, mas eles ficarão igualmente felizes se for um papa de outra cor, de outro continente", disse à RFI. "A questão principal para a Igreja na África e no mundo é como responderemos aos desafios que se apresentam hoje, como podemos contribuir em termos de imaginário, de espiritualidade, de teologia", pergunta. "A Igreja africana continua aberta, disponível àquilo que for decidido para o resto do mundo", acrescenta. "Podemos pensar em ter um papa asiático ou de qualquer outra região do mundo. Não devemos focar numa questão geográfica, mas espiritual", completa.
"Figura de consenso" 6m2j2w
Para o vaticanista italiano Marco Politi, após um pontificado marcado por profundas divisões na Igreja Católica, o próximo papa deverá ser uma figura de consenso, capaz de "recompor" as diferentes correntes, conforme antecipou em entrevista à AFP.
Dos participantes do conclave, 80% nunca estiveram num evento assim e se conhecem pouco, o que pode constituir uma dificuldade adicional no processo. "Este é o conclave mais espetacular dos últimos 50 anos. É o primeiro conclave em 50 anos em que há um forte sentimento de divisão na Igreja. Esse é seu principal desafio", diz Politi. "Há um grande número de cardeais que vem dos lugares mais remotos do mundo, e uma grande parte deles não conhece uns aos outros nem o funcionamento do governo central da Igreja", observa. "Muitos nunca foram a Roma e têm dificuldades com o idioma porque o italiano não é mais a língua comum", continua. "Tudo isso torna este conclave difícil", avalia.
"Haverá uma escolha entre um papa que desacelera e outro que avança lentamente. Porque se sabe que não haverá um Francisco II. Francisco era muito impulsivo e mudava as coisas através de gestos e palavras repentinas, ainda que pensados", afirma. "É necessária uma gestão mais cuidadosa, mais colegiada. Francisco trabalhou pouco em equipe com os escritórios da Cúria; alguns cardeais o criticaram por não convocar o Colégio Cardinalício", analisa.
Além do abuso, que ele considera um "assunto recorrente", o vaticanista Marco Politi aponta outros desafios do próximo pontificado: "restaurar o senso de um sistema de trabalho colegiado, no qual o papa também considere os dicastérios da Cúria", insiste. Ele também aponta que há dúvidas se o Sínodo de Francisco continuará ou não. Enquanto estava no hospital, Francisco estabeleceu um programa de três anos com três pontos: promover o papel das mulheres, prestar contas e criar órgãos consultivos. "Esse é o desafio: seu sucessor continuará o programa ou o abandonará?"
Um dos pontos principais a serem abordados no conclave é a capacidade de revitalizar a Igreja. O vaticanista italiano lembra que nenhum dos últimos três papas (João Paulo II, Bento XVI e Francisco) "conseguiu superar a crise da Igreja em suas estruturas diocesanas e paroquiais". As vocações continuam diminuindo, o que também é motivo de preocupação, segundo ele.
O próximo papa "deve ser capaz de reconstruir, de dar novo impulso à vida religiosa em sua base, de ter uma presença internacional, como Francisco, e de falar ao povo. Ou seja, ter carisma. Ratzinger [Bento XVI], por exemplo, não tinha, ao contrário de Wojtyla [João Paulo II] e Bergoglio [Francisco]".
Por fim, Politi explica que os ultraconservadores não podem decidir quem será o próximo papa, pois precisam se aliar ao centro. "Precisaria ser um conservador com uma face humana, simpática, que se comunique e consiga controlar o diaconato, mas com delicadeza. Essa figura ainda não surgiu", conclui.
(Com RFI e AFP)